Dra Lucilândia Bezerra: na clínica, na docência e na pesquisa
Setembro é um mês de celebração e reconhecimento, e dentro da campanha de valorização promovida pelo Conselho Regional de Medicina Veterinária (CRMV) Tocantins, unida ao mote nacional do Sistema CFMV/CRMVs — “Médico-veterinário: profissional presente” —mostramos como esses profissionais estão presentes no dia a dia dos tocantinenses, resguardando a saúde e o bem-estar dos animais, protegendo a saúde humana e contribuindo para a preservação do meio ambiente.
Nesta entrevista especial, apresentamos a trajetória inspiradora da médica-veterinária Dra Lucilândia Maria Bezerra, que, com dedicação à docência, à clínica e à pesquisa, mostra que a presença do médico-veterinário vai muito além do cuidado com cães e gatos: é compromisso com a vida em todas as suas dimensões.
CRMV Tocantins: Como foi a sua escolha pela medicina veterinária?
Dra Lucilândia Bezerra: Desde criança eu já sabia que queria ser médica-veterinária, a contragosto da família, que queria que eu fizesse medicina humana. E eu optei pela veterinária porque sempre tive uma paixão muito grande pelos animais. Sempre tive muita compaixão por eles também. Eu morava no interior, onde havia muitos animais e até mesmo contato com silvestres. Isso despertou em mim essa vontade desde criança.
CRMV Tocantins: Onde você se formou?
Dra Lucilândia Bezerra: Eu me formei na Universidade Federal de Goiás, onde fiz a graduação e depois o doutorado em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais.
CRMV Tocantins: Na sua opinião, qual o maior desafio da profissão?
Dra Lucilândia Bezerra: São muitos desafios. O maior deles, dentro da medicina veterinária, é justamente o reconhecimento do nosso trabalho por parte da sociedade. Muitas vezes as pessoas acham que o médico-veterinário cuida apenas de cachorrinhos e gatinhos. Mas não é isso. Nossa profissão é muito ampla, com uma gama de áreas de atuação que vai desde os alimentos que chegam à mesa até a saúde pública, com foco em doenças infecciosas e zoonóticas.
CRMV Tocantins: Como é sua atuação atualmente?
Dra Lucilândia Bezerra: Hoje, depois da minha quinta pós-graduação, continuo atuando em clínica, porque sempre foi minha paixão. Mas também sou professora, já estou na docência há 13 anos, e amo ensinar. Para mim, é uma das áreas da vida profissional que mais amo: passar o que sei aos alunos, vê-los se formando com sonhos e incentivá-los a seguir em frente.
Tenho um filho que também cursa medicina veterinária e vai se formar no próximo ano. Sempre o incentivo, porque acredito que todas as profissões são feitas para serem exercidas com amor. Todas têm desafios — mercado de trabalho, reconhecimento, valorização. Mas a medicina veterinária tem um aspecto especial, porque, com raras exceções, a maioria das pessoas ainda não valoriza os animais como deveriam e o equilíbrio da natureza depende deles. O médico-veterinário tem esse olhar diferenciado, que não se limita ao cuidado quando estão doentes, mas também à prevenção.
CRMV Tocantins: Essa seria a área mais importante da medicina veterinária?
Para mim, a medicina veterinária preventiva é a área mais importante. E nosso maior desafio é fazer com que os responsáveis entendam isso. Muitos não se preocupam com prevenção; acham que, se o pet está comendo e brincando, está tudo bem. Mas não está: ele está exposto a perigos e vetores de doenças.
Infelizmente, faltam políticas públicas de educação ambiental. Então sobra para o veterinário fazer esse trabalho de formiguinha, de educação individual, que é muito difícil e desafiador.
CRMV Tocantins: A senhora vai receber uma premiação da Academia Brasileira de Cultura pelo seu trabalho desenvolvido com a Leishmaniose. Conta um pouco sobre isso.
Dra Lucilândia Bezerra: Sim, foi uma surpresa enorme. A Academia Brasileira de Cultura me convidou para essa premiação. Eles fazem uma pesquisa extensa sobre a vida profissional de quem será homenageado. Essa comenda é um reconhecimento pela trajetória.
Desde que me formei, sempre me dediquei muito à pesquisa, não apenas por ser professora, mas por realmente gostar de buscar as causas das doenças. Na minha área, a infectologia, trabalhei especialmente com as leishmanioses. Esse foi meu grande desafio quando cheguei a Palmas, em 2002. Naquela época, havia muitos casos de eutanásia em cães, e aquilo me chocou, parecia um ‘canicídio’.
Me assustou muito. Vim de uma região que não era endêmica para a doença e então eu comecei a estudar. Fiz mestrado, doutorado, estou em pós-doutorado e participo da equipe nacional de pesquisa sobre leishmaniose, Brasileish. Todos os anos me atualizo, porque considero essa uma doença fundamental, não só por ser zoonose, mas porque causa muito sofrimento às famílias. É silenciosa e, quando descoberta, já está em fase difícil de recuperação dos animais. Além do que, como muitas doenças infecciosas, é de difícil tratamento.
Já desenvolvi vários trabalhos de pesquisa e tenho lutado muito contra a leishmaniose. Atualmente estou em um projeto com a Fiocruz sobre leishmaniose em felinos, que se tornou um problema emergente. Estamos iniciando um estudo epidemiológico para entender até que ponto os gatos são reservatórios ou potenciais transmissores, e que tipos de parasitas estão envolvidos. Ainda não temos todas as respostas, mas espero que até o próximo ano possamos avançar bastante.
Por isso, esse prêmio veio como um presente: um reconhecimento inesperado, mas muito gratificante. A comenda é o mais alto grau de premiação da Academia, e recebê-la representando a saúde e a região Norte é algo muito importante para mim.
A cerimônia seria em Palmas, agora em setembro, mas por questões logísticas será em Macapá, em novembro deste ano. Estou muito feliz e honrada.
Ascom CRMV Tocantins
Palmas, 28 de setembro de 2025